O MONSTRO DA SEMANA:
ANJINHOS BARROCOS
Pois era assim mesmo, seu moço: quando eu era moleque, a gente ganhava algum cobre caçando anjinho barroco na velha igrejinha da cidade. Os bichos viviam a base de reza,sempre saindo dos seus cantos quando alguém puxasse o terço ou arriscasse algum latim, e passarinhavam pra todo lado , bicando cada pedaço de oração que fosse subindo pro céu.
Era tudo até bonito de se ver, sô, mas aquilo era uma peste. Vivia só pra voar e engordar e dar aquelas cagadinhas de pombo na cabeça de qualquer pecador que passasse por baixo. E os padres não deixavam ninguém de chapéu na cabeça dentro da igreja, então, já viu.
A paróquia pagava uns bons vinténs por par de asa e a gente aproveitava, ué. Mas os bichos eram espertos, seu moço. Se a gente chegasse de fininho quando os anjinhos bebiam água na beira da pia de batismo, sentiam o cheiro de má-criação da molecada e avoavam pra tudo que era lado desde que fosse bem longe .
O jeito era montar armadilha, escolher bem a isca. A gente queria farelo de hóstia levando até a arapuca no relicário, mas os padres não deixavam, aquela bagunça toda, que devia ser pecado, aliás. O jeito era fazer tocaia durante a semana, mesmo: sempre tinha alguma beata rezando sozinha, com os anjinhos atentos, lá dos seus ninhos. A beata rezava, rezava, rezava, e acabava caindo no sono e aí os bichos chegavam devagarinho, pra espiar se tinha sobrado alguma ave-maria caída debaixo do banco.
A gente, só de longe, na porta da igrejinha olhando: quando algum dos bichos entrava na mira , PÁ! tacava-lhe uma edição em volume único d’O Capital bem no meio dos cornos. O bando se espalhava, mas a gente sempre pegava algum. Não sobrava quase nada da criatura, né, quase só a mancha onde o bicho e o livro acertavam juntos a parede e um rastro de plumas flutuando no ar ao sabor dos roncos da beata, que nunca acordava com o pá!da gente.
Mas aqueles bichos eram uma peste, mesmo: não prestavam pra gente comer nem pra alimentar a criação. Se provasse um pedacinho que fosse, a gente ficava uma semana inteira peidando fumaça de incenso , vou te contar!...
ANJINHOS BARROCOS
Pois era assim mesmo, seu moço: quando eu era moleque, a gente ganhava algum cobre caçando anjinho barroco na velha igrejinha da cidade. Os bichos viviam a base de reza,sempre saindo dos seus cantos quando alguém puxasse o terço ou arriscasse algum latim, e passarinhavam pra todo lado , bicando cada pedaço de oração que fosse subindo pro céu.
Era tudo até bonito de se ver, sô, mas aquilo era uma peste. Vivia só pra voar e engordar e dar aquelas cagadinhas de pombo na cabeça de qualquer pecador que passasse por baixo. E os padres não deixavam ninguém de chapéu na cabeça dentro da igreja, então, já viu.
A paróquia pagava uns bons vinténs por par de asa e a gente aproveitava, ué. Mas os bichos eram espertos, seu moço. Se a gente chegasse de fininho quando os anjinhos bebiam água na beira da pia de batismo, sentiam o cheiro de má-criação da molecada e avoavam pra tudo que era lado desde que fosse bem longe .
O jeito era montar armadilha, escolher bem a isca. A gente queria farelo de hóstia levando até a arapuca no relicário, mas os padres não deixavam, aquela bagunça toda, que devia ser pecado, aliás. O jeito era fazer tocaia durante a semana, mesmo: sempre tinha alguma beata rezando sozinha, com os anjinhos atentos, lá dos seus ninhos. A beata rezava, rezava, rezava, e acabava caindo no sono e aí os bichos chegavam devagarinho, pra espiar se tinha sobrado alguma ave-maria caída debaixo do banco.
A gente, só de longe, na porta da igrejinha olhando: quando algum dos bichos entrava na mira , PÁ! tacava-lhe uma edição em volume único d’O Capital bem no meio dos cornos. O bando se espalhava, mas a gente sempre pegava algum. Não sobrava quase nada da criatura, né, quase só a mancha onde o bicho e o livro acertavam juntos a parede e um rastro de plumas flutuando no ar ao sabor dos roncos da beata, que nunca acordava com o pá!da gente.
Mas aqueles bichos eram uma peste, mesmo: não prestavam pra gente comer nem pra alimentar a criação. Se provasse um pedacinho que fosse, a gente ficava uma semana inteira peidando fumaça de incenso , vou te contar!...
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