sexta-feira, 1 de julho de 2011

[roteiro-animação] passeio no parque

[Este é um tratamento que escrevi há alguns anos atrás para LETÍCIA ALBUQUERQUE, que estava então desenvolvendo uma projeto de animação em episódios curtos, público infanto-juvenil.
O foco da série é o dia-a-dia de duas irmãs , a adolescente JULIA e a caçula MARINA (sempre acompanhadas do cãozinho DADO ) em cenários e situações típicos da cidade de Belo Horizonte contemporânea.
Todos os direitos reservados à Letícia, é claro - 'brigadão, moça!]

[sem diálogos]

FADE IN
EXT. ENTRADA DO PARQUE MUNICIPAL - DIA

Um bando de pombas ataca calmamente a ração amarela que cobre o chão, seu prato matinal. de repente, espalham-se pra todos os lados num estardalhaço de arrulhar e penas: Dado pula latindo no meio delas, estragando seu café da manhã e divertindo-se imensamente com a traquinagem.

Uma voz adulta o chama fora de quadro. ele se afasta, língua de fora, satisfeito .

As pombas retornam, contrariadas.

Julia, Marina, sua mãe e seu pai estão nos portões do Parque Municipal. é manhã de domingo: de um lado, a agitação comercial da Feira Hippie; do outro, a agitação de playground  [arborizado] do Parque.

Marina ralha um pouco com Dado, enquanto lhe põe uma coleira. os outros trocam beijos e recomendações sorridentes: o grupo se divide em dois, a mãe e Júlia, de óculos escuros, partem pro interior da multidão de barraquinhas e compradores; o pai , puxando pelo guidon uma bicicleta infantil, desce parque abaixo com Marina e Dado. As duas meninas exibem quase o mesmo estado de agitação infantil incontrolável.

Dado é o último a sumir do quadro, arrastado contra vontade, tentar voltar à carga contra o pobre bando de pombas, que está de sobreaviso contra o atacante.

EXT. FEIRA HIPPIE - DIA

Visão panorâmica da feira: a multidão densa aparece de forma quase indiferenciada, monocromática -- destaca-se apenas o par de mãe e filha, coloridas.estas se materializam instanteanmente, conversadoras, barganhando, em cantos distantes do tumulto, um segundo na frente de uma barraquinha em primeiro plano, no outro, em frente à outra, lá num canto do plano de fundo, e daí por diante, incansáveis.

EXT. PARQUE MUNICIPAL - DIA

O pai pára no passeio de uma das alamedas do parque. é ele quem segura a coleira de Dado, que chega um par de segundos depois, mau-humorado. O pai infla o peito e as narinas, sorridente, tentando captar o ar puro proporcinado por toda aquela verdura a seu redor. pára de se inflar: começa a farejar o ar, captando algum odor suspeito. Olha ao redor de si, levanta um pé pra olhar a sola do sapato. nesse momento, Marina passa a seu lado, montada na bicicleta, mas sem ter muito controle da mesma, ziguezagueando alameda a fora. O pai abre um sorriso orgulhoso pra filha, mas o sorriso se desmonta quando ela sai de quadro. Ele faz alguns sinais de alerta, faz que vai dar um grito de 'cuidado', pára, faz uma careta, corre pra fora de quadro arrastando o Dado, pra impedir ou remediar alguma catástrofe que a gente não vê.

EXT.FEIRA - DIA
Série de cortes rápidos: Julia e a mãe experimentam uma série de quinquilharias diferente em diversas barraquinhas da feira, quase que em imagens congeladas-instantâneos.

Experimentam óculos escuros com armações espalhafatosas.

Vestem montes de bijouterias, examinam uma a outra cheias de elogios.

Comem espetinhos enormes, olhando assustadas pra câmera, coradas de vergonha ao serem pegas no ato de burlar suas dietas comedidas.

Julia posa vaidosa para um desenhista da feira. Vemos seu retrato pronto, e ele ganha vida-vira animação, a mãe entrando em quadro, série de sacolas de plástico enfileiradas nos braços, esbaforida, instando a filha se apressar. As duas saem rapidamente por um lado do quadro. Logo depois voltam, visivelmente confusas e saem pelo outro.


EXT.PARQUE - DIA
Marina está sentada num dos bancos da alameda, fungando, uma mancha de sujeira escura num dos joelhos, a bicicleta jogada de um lado, Dado prestativo do outro.

O pai chega, numa das mãos traz um monte de balões coloridos, na outra, algodão doce tão colorido quanto. Marina sorri, enxuga os olhos, mas então aproveita a vantagem e aponta pidona pra algo que está fora do quadro.

O pai olha pra direção apontada, dá um leve suspiro, mas sorri e balança a cabeça em concordância.

EXT.PARQUE - DIA
Um veterano fotógrafo de lambe-lambe sorri para pai e filha. Ela sorri extasiada, posando para a foto de cima de um pônei, ainda segurando balões e algodão doce. O pai e Dado, ao lado, prestativos. O pônei masca palha, indiferente.

O fotógrafo desaparece sob a capa do lambe-lambe; volta quase imediatamente, fazendo sinal ao pai pra sair de quadro. O outro se desculpa, afasta-se; Dado fica em seu lugar, sentadinho, curioso, até que o pai o puxa pela correira num arranco.

O fotógrafo reassume sua posição, satisfeito.

Então o pônei, com a expressão sonsa e o mascar mecânico inalteráveis, começa a caminhar lentamente pra fora de cena, Miriam equilibrando-se na cela, olhando de um lado pro outro sem saber o que fazer, o sorriso da pose congelado no rosto.

O fotógrafo ressurge indignado. O pai retorna à cena, embaraçado, pede paciência ao outro, sai à cata da filha.

O velho senhor aguarda impaciente ao lado do lambe-lambe. O pai retorna puxando a custo o pônei pelo cabestro. Marina, desmontadada, chega em seguida, Dado obediente ao lado, segurando os balões com uma mão, lambendo o algodão doce com uma cara de platéia cativa.

O pônei empaca de vez, longe da marca. O pai exaspera-se, larga o cabreço, coça a cabeça, muda de lado, faz menção que vai empurrar o bicho pelos quartos traseiros.

Fecha na expressão de espanto do pônei, que ergue as olheras, arregala os olhos

EXT.PARQUE - DIA
Uma tomada do céu entre as árvores do parque. Fora de quadro, um relincho indignado, um sm de martelo batendo em bigorna, um ai!bem claro. as pombas voam em polvorosa, assustadas.

EXT.PARQUE-DIA
Uma foto em preto-e-branco de lambe-lambe: o pai caído sentado no chão, aturdido, desalinhado, uma marca de ferradura na camiseta. Marina a seu lado, preocupada, a mão que segura o algodão doce, afastada - o pônei, de volta a sua tranquilidade habitual, come a massa colorida sem que a garota perceba.

Dado está no plano de fundo, segurando a nuvem de balões pela boca, com dificuldade, erguido no ar como que num pulo.

EXT.PARQUE-DIA
O pai está sentado, expressão chorona , ainda amorratada, no banco à beira da alameda.
Marina aproxima-se com algodao doce e lhe oferece.
Ele sorri, e então aponta pidão pra um ponto fora de quadro.
Marina olha pra onde o pai aponta, volta-se pra ele com um suspiro, sorri balançando a cabeça em concordância.

EXT.LAGOA - DIA
O pai pilota um dos pedalinhos como se fosse um carrinho bate-e-bate, a lingua de fora , expressão alucinada de satisfação infantil.

Marina o observa da margem, mãos cruzados, sorriso maternal.

A mãe chega , tomada de sacolas de compras, um cado sem fôlego, cumprimenta-a, curvando-se com dificuldade para um beijo, pergunta-lhe algo,Marina responde apontando pro meio do lago, a mãe solta uma risada de surpresa.

Júlia chega em seguida, um monte de balões numa mão, algodão doce na outra e que ela ataca ferozmente. De boca cheia, lança uma pergunta a Marina. esta assusta-se, começa a olhar em volta, no que é acompanhada pela mãe...

EXT.CÉU SOBRE O PARQUE-DIA
Do alto, o arvoredo e a lagoa bem visíveis, abaixo: Dado dependurado pela boca do cordel que segura os balões, girando, ganindo baixinho, olhando suplicando pro chão.

Bater de asas: um pombo aparece em quadro, paira com esforço em frente ao cãozinho desamparado, estreita os olhos e sorri sacana. Dado responde com um meio sorriso, amarelado, e engole em seco.

FADE OUT

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